BAUHAUS – REVOLUÇÃO NA ARQUITETURA

Por séculos consecutivos, a arquitetura era um privilégio de uma clientela de classe social privilegiada, voltada efetivamente para a decoração das grandes igrejas, palácios de nobres poderosos e mansões de uma burguesia ascendente. A beleza arquitetônica das cidades resumia-se nas suas obras públicas de cunho religioso, com monumentais mosteiros e adornadas igrejas. A população urbana era distribuída por insignificantes prédios, sem conforto, beleza ou mesmo saneamento básico. O desleixo urbano foi responsável por várias epidemias, entre elas a conhecida peste negra, que dizimou quase toda a população européia medieval. Ao contrário do que se pensa, surtos de pestilências ultrapassaram a Idade Média, matando até os tempos modernos.
A industrialização acelerada das cidades trouxe novos materiais como o ferro fundido e o aço, que poderiam ser usados na arquitetura. Movimentos arquitetônicos de cunho modernistas e precursores de uma nova vanguarda, explodiram pela Alemanha no início do século XX. A sua atuação seria interrompida pela Primeira Guerra Mundial. Após a guerra, uma Alemanha falida e humilhada dava passagem para a volta da vanguarda arquitetônica, voltada para a necessidade urgente da expansão industrial. Em 1919 surgiu a Bauhaus, escola arquitetônica criada por Walter Gropius. Fundada em Weimar, pátria de Nietzsche e Goethe, esta escola proclamava a unidade das várias disciplinas artísticas, incorporando-as à arquitetura em um amplo objetivo. Os homens da Bauhaus defendiam a ligação entre o desenho industrial e à produção da indústria, razão que os levou a desenvolver a escola em grandes centros urbanos, onde a industrialização era latente.
Pelos Bauhaus passaram grandes mestres: Paul Klee, Laszlo Moholy-Nagy, Marcel Breuer, Vassily Kandinsky, Oscar Schlemmer, Mies van der Rohe, Gerhard Marcks, Josef Albers e outros. O movimento tornou-se referência internacional, atraindo artistas de todo o mundo para a confusa Alemanha do pós-guerra e pré-nazista. O Bauhaus traziam não só a renovação artística, como também uma ideológica inquietação social e política.
Contestados pelos conservadores alemães, que achavam a arquitetura Bauhaus muito aquém do nacionalismo alemão surgido com a ascensão nazista, os integrantes do movimento sofreram ferozes críticas e perseguição. Associados aos comunistas e ao construtivismo russo, os Bauhaus passaram a ser abafados pelos partidários do nazismo. Com a subida de Hitler ao poder, a Bauhaus morreria voluntariamente em 1933, em Berlim, a última cidade onde se instalara. Seu legado ultrapassou as fronteiras alemãs, atingindo e modernizando a arquitetura mundial. O maior centro arquitetônico Bauhaus encontra-se em Tel Aviv, Israel. Nove décadas depois da fundação, a Bauhaus voltaria à Alemanha com o fim da guerra e do nazismo. Continua a ser uma das mais influentes escolas de arquitetura do mundo, apesar de não ter aquela essência de vanguarda que abalou e o modificou os alicerces da arquitetura no início do século XX. A Bauhaus de Weimar continua a exercer influência em arquitetos de todo o planeta.

As Indústrias e as Novas Tendências da Arquitetura

No fim do século XIX desencadeou-se a Revolução Industrial, com ela um grande fluxo de pessoas abandonou os campos, invadindo as cidades. Surgia a necessidade de uma nova paisagem urbana, voltada não somente para a elite, mas para uma pulsante população. Os arquitetos passaram a ter à disposição novos materiais para serem usados nas construções, como o ferro fundido e o aço. As fachadas de pedras estavam condenadas.
A indústria da época passou a criar novas possibilidades, passando a produzir aos milhares, as diversas partes dos edifícios, antes confeccionados manualmente. As mudanças encerravam uma fase da arquitetura, voltada para uma beleza concebida em uma harmonia de poucos prédios, jamais de uma explosão demográfica urbana.
A consciência de que a arquitetura tradicional não se adaptava mais à realidade urbana criada pela Revolução Industrial, só foi percebida por alguns arquitetos no fim do século XIX. Um dos pioneiros dessa percepção, Otto Wagner, professor de arquitetura em Viena, Áustria, já conclamava, em 1896, que nada que não fosse prático não poderia ser belo, a arquitetura deveria ter harmonia com a época, não com a tradição secular. O aço, o alumínio, o ferro, o celulóide, a linóleo e o cimento passaram a ser considerados pelos arquitetos vanguardistas como os materiais que iriam construir as novas cidades.
Um dos herdeiros das novas idéias sobre arquitetura moderna foi o alemão Walter Gropius, nascido em Berlim, em 1883. Gropius fez parte da associação Deutscher Werkbund, fundada em 1907 por Hermann Muthesius. A associação de Muthesius era defensora da idéia da razão e da simplicidade na construção e na arte, estabelecendo ligações entre artesãos, artistas e a indústria.
Aceitando os princípios de Muthesius, Walter Gropius construiu, em 1911, a fábrica de Fagus, em Alfeld na der Leine, considerada a obra-prima da arquitetura metálica do século XX. O edifício serviu como ponto de partida da renovação da arquitetura moderna. Em 1914, a Deutscher Werkbund realizou a primeira manifestação coletiva, promovendo uma grande exposição em Colônia. O evento foi marcado pela participação massiva de arquitetos não acadêmicos. O trabalho do grupo seria interrompido pela deflagração da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), passando por um período de silêncio vanguardista.

A Criação da Bauhaus na República de Weimar

Com o fim da Primeira Guerra Mundial, a Alemanha foi severamente punida pelos países vencedores, vendo-se obrigada a pagar vultuosas indenizações. O país passaria por um período financeiro difícil, sendo obrigado a expandir a indústria para que superasse as deficiências da economia. O período de reconstrução alemã possibilitou possibilitou o surgimento de indústrias, o florir de arrebatadas tendências ideológicas, e a efervescência cultural que geraria vários movimentos de vanguarda. No período pós-guerra, a Alemanha inaugurava a sua primeira República, conhecida como República de Weimar.
Em 1919, Walter Gropius assumiu a direção da Escola de Arte de Weimar, inaugurando-a com o nome de Staatliches Bauhaus (casa estatal de construção). A escola tinha como objetivo principal aproximar o mundo da arte ao mundo da produção industrial. Concentrava-se nos projetos da estrutura das construções e não em seus ornamentos, defendendo a funcionalidade e utilidade da arquitetura.
Os Bauhaus tinham no seu discurso, claras tendências e referências ao grupo holandês de De Stijl, que assinalaram o tempo de Weimar; e, o construtivismo russo, característica da época em que a escola permaneceu em Dessau. A Bauhaus aglutinou artistas de todas as aéreas, praticando em suas salas desde a arquitetura, pintura e escultura, ao teatro, a dança e a fotografia. A Bauhaus tornou-se o ponto de encontro de todas as artes e idéias inovadoras da época.Atraiu artistas e adeptos em todo o mundo.
Uma das características da Bauhaus era manter-se aberta para todos os movimentos de vanguarda, tendo aglutinado expoentes do cubismo, do construtivismo e da arte abstrata. Foram mestres da escola alguns dos maiores artistas do século XX, entre eles, além de Walter Gropius, Laszlo Moholy-Nagy, Vassily Kandinsky, Paul Klee, Lyonel Feininger, Josef Albers, Marcel Breuer, Oskar Schlemmer, Marianne Brandt, Johannes Itten, Gerhard Marks, Georg Muche, Gunda Stölzl, Omar Akbar, Hinnerk Scheper, Joost Schmidt, Lothar Schreyer, Dietmar Starke e Magdalena Droste.

A Influência da Bauhaus

Exercendo uma influência e prestígio na arte de projetar, a Bauhaus combatia arrebatadamente a arquitetura tradicional, considerada pela escola como inadequada ao mundo moderno. Tornou-se referência em todo o planeta como um novo estilo que a arquitetura deveria seguir.
Com professores de elevado prestígio em seus quadros, a Bauhaus atraiu um grande número de alunos, sendo duzentos e cinqüenta já no início. Uma das peculiaridades do curso era o seu currículo, que privilegiava não só o ensino teórico, como o ensino prático. No primeiro semestre eram estudadas as propriedades dos materiais usados. Nos três anos seguintes estudavam as técnicas e as formas, simultaneamente.
O primeiro balanço público dos resultados da escola foi apresentado em 1923, com uma apresentação memorável de eventos que traziam projeções cinematográficas, concertos, balés e conferências. Na época foi publicado um álbum com reproduções das obras de alguns mestres e discípulos da Bauhaus. Durante o evento, foi projetada e construída nos estúdios do instituto, uma casa totalmente mobiliada, chamada de Hausam Horn.
A melhora da situação econômica da Alemanha, proporcionou o crescimento da indústria. Empresas encomendavam cada vez mais projetos a Bauhaus. Era a consolidação de uma estreita ligação entre o design e a produção industrial, ponto chave da filosofia da escola. Em 1925, as cadeiras de tubo de aço de Marcel Breuer foram industrializadas. Luminárias, desenhos de móveis, vitrais, copos, tecidos concebidos pelos Bauhaus foram apresentados ao mundo pelas indústrias, sendo até hoje usados como ornamentos e utensílios domésticos.

O Nazismo e o Fim da Bauhaus

Apesar do imenso prestígio que alcançou dentro da Alemanha e no resto do mundo, a Bauhaus passou a ser perseguida pelos alemães mais tradicionais, entre eles os nazistas, que estavam em franca ascensão. Os mais radicais acusavam os membros da escola de desprezarem a herança histórica nacional. Para os tradicionalistas, a arquitetura modernista da Bauhaus não era adequada para a grandiosidade da Alemanha que o regime nazista ansiava.
Atacados pelos defensores dos nazistas, diante das fragilidades da proteção das autoridades de Weimar, a escola viu-se obrigada a transferir-se para Dessau. Ali, Walter Gropius construiria, em 1925, uma nova sede para a instituição.
É no período da escola em Dessau, que a colaboração com as indústrias seria amplamente intensificada. A maioria dos protótipos executados na Alemanha, saiam diretamente das oficinas de Dessau para as indústrias. Muitos dos artistas bauhausianos passaram a dedicar-se ao desenho industrial, enquanto que alguns dos seus discípulos ocupavam postos importantes nas grandes empresas.
Em 1928, apesar das pressões sobre os seus membros pelos tradicionalistas, a Bauhaus já era uma instituição inequivocamente estabelecida. Naquele ano, Walter Gropius passou a direção da escola a Hannes Meyer, inaugurando um novo período, o segundo. Os ventos políticos na Alemanha começavam a soprar contrários à efervescência vanguardista. A pressão dos grupos nazistas levou o novo diretor da Bauhaus a demitir-se em 1930. Ludwig Mies van der Rohe foi quem o substituiu, dando início ao terceiro período da história da Bauhaus.
Mies van der Rohe seria o último diretor da Bauhaus. Mudaria novamente a sede, em 1932, de Dessau, considerado um lugar de maioria de esquerda, para Berlim. A chegada a Berlim culminou com a ascensão nazista ao poder. Em 1933, Hitler assumiu a chancelaria alemã. O líder nazista sentia-se incomodado pelo modernismo em gestação na Alemanha. O führer tinha outras inclinações estilísticas, herdeiras de uma tradição neoclássica. Queria monumentos grandiosos para um império, que ele previa, teria a duração de mil anos. Dotados de uma visão crítica e racional, os bauhausianos não aceitavam a ideologia nazista. Também os nazistas não aceitavam os Bauhaus, associados ao partido comunista, e às suas obras, longe do ideal clássico por eles ansiado. Com extinção da República de Weimar, também a Bauhaus chegava ao fim, sendo encerrada em Berlim, em 1933. Seus edifícios tornaram-se centros de formação para os oficiais do partido nazista.
Com o fechamento da escola, a maior parte dos membros da Bauhaus emigrou para os Estados Unidos. Em 1937, Laszlo Moholy-Nagy fundaria, em solo norte-americano a Bauhaus de Chicago. Em seus catorze anos (1919-1933), a Bauhaus criou o que ainda hoje é considerado o mais moderno na estética industrial.

A Cidade Branca de Tel Aviv, Maior Acervo da Arquitetura Bauhaus

A influência da Bauhaus pode ser vista não só no design industrial moderno, como em lugares específicos do planeta. Após a reunificação alemã, a cidade de Dessau passou a atrair milhares de visitantes, em busca da história da Bauhaus e, tornou-se um pólo de reflexão sobre o espaço urbano. Muitos dos prédios da escola foram destruídos durante a Segunda Guerra Mundial, sendo o de Dessau o que mais se preservou erguido. O prédio foi praticamente reconstruído. A recuperação dos prédios é uma das prioridades da administração de Dessau.
A maior herdeira da escola Bauhaus é a cidade de Tel Aviv, em Israel. Na década de 1930, fugindo da perseguição nazista, diversos arquitetos judeus alemães instalaram-se na Palestina, então um protetorado britânico. Traziam na bagagem a herança do racionalismo arquitetônico Bauhaus, perfeitamente encaixada na construção da jovem cidade de Tel Aviv. Foi erguido um conjunto com mais de quatro mil prédios racionalistas. Por causa da cor empregada na maioria dos edifícios, o branco, Tel Aviv, a cidade dos Bauhaus, passou a ser chamada de “Cidade Branca”. Em 2003, a Unesco declarou os edifícios da Cidade Branca de Tel Aviv como Patrimônio Mundial da Humanidade. A cidade traz na sua arquitetura, a maior herança Bauhaus, visível e de acesso a quem a visita.
Após a explosão das tendências e predominâncias da filosofia da escola Bauhaus, a arquitetura jamais foi a mesma. Estava enterrada de vez a beleza grandiosa das grandes construções, dando passagem para a racionalidade prática da arquitetura urbana moderna.

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